
Excesso de senhas provoca irritação e fadiga em usuários
Especialistas ensinam como lidar com códigos sem perder a segurança.
Pesquisa aponta que 58% dos americanos têm cinco ou mais senhas.
Talvez você comece com as senhas para destravar o celular e para ligar o
computador da empresa. Na internet, usará senhas para acessar e-mail,
Facebook, Twitter, sites de comércio online e assinaturas de sites de
notícias. No meio do dia, é hora de lembrar o código do vale-refeição ou
do cartão de crédito. Vai sacar dinheiro? Usará a senha alfabética
exigida por alguns caixas eletrônicos.
Essa profusão de códigos que somos obrigados a memorizar abre debates
sobre segurança online e já ganhou até nome: “password fatigue” ou
“password overload” (fadiga ou sobrecarga de senhas, em tradução livre).
Uma pesquisa de agosto da empresa de tecnologia Janrain, feita com 2,2
mil americanos, apontou que 58% dos entrevistados têm cinco ou mais
senhas para lembrar, e 30% têm dez senhas.
Mais de um terço deles declarou que preferiria cumprir uma tarefa
doméstica – lavar roupa ou limpar o banheiro – a criar um novo cadastro
de login e senha.
Dor de cabeça
A atriz brasileira Marianna Armellini se inclui entre as que preferem
lavar roupa a inventar uma nova senha. “Anoto as senhas e depois não
lembro onde anotei. Entro em pânico se não vejo aquele campo de
esqueceu a senha, diz à BBC Brasil.
Algumas das coisas que mais a irritam: memorizar as senhas de sites
pouco acessados, como os de milhagem, e aquela autenticação feita por
perguntas e respostas. “Como vou lembrar o nome da minha professora
preferida do primário?”, brinca.
As senhas acabaram virando tema de um programa humorístico do grupo
cênico As Olívias, do qual Marianna faz parte. No vídeo, disponível no
YouTube, a personagem dela fica em apuros ao esquecer a senha do cartão
durante uma compra – seria a combinação da data da primeira menstruação e
do número do sutiã, ou a data do término do casamento?
“Tenho um amigo que, depois que esqueceu a senha para destravar seu
iPhone, precisou trocar de telefone! é uma dor de cabeça, porque toda a
sua vida está [no aparelho]”, conta Marianna.
A professora de inglês Ana Bailune, de 47 anos, de Petrópolis (RJ), diz
que as senhas a confundem “a ponto de eu ter que telefonar ao meu
marido durante as compras para que ele me ajude a lembrar a senha dos
cartões de crédito”.
Ela usa com frequência quase dez senhas, entre celular, e-mail, cartões, sites de compras, conta no banco e blogs.
“Uma vez, tentei associar os números a eventos reais, como datas de
aniversário, números de casas onde moramos, etc. Não deu certo. Pensava:
de quem era mesmo o aniversário? Ah, da minha mãe! mas quando é o
aniversário dela?”.
Segurança
Para alguns especialistas, essa sobrecarga se dá porque a internet
originalmente não foi pensada para conter tantos dos nossos dados
pessoais.
Como hoje uma grande parte da nossa vida está sob esses códigos, quão seguros eles são – ou deveriam ser?
Joseph Bonneau, que estudou senhas e segurança cibernética na
Universidade de Cambridge, diz que muitas das senhas escolhidas pelas
pessoas são extremamente fracas, como ABCDE. Ainda assim, ele não acha
que o tema deva ser encarado com paranoia.
“Minha sugestão é ter senhas bem seguras para coisas importantes, como o
cartão de banco e e-mail.” Nesses casos, diz, vale evitar números
associados à sua vida e apostar em em combinações aleatórias de letras e
números que, como serão usadas com frequência, acabarão sendo
memorizadas.
Para cadastros menos importantes, senhas simples bastam, diz ele.
Outra sugestão de Bonneau é usar “password managers” (gerenciadores de
senha), programas que, sob uma única senha mestra, geram códigos para as
demais senhas que você precisar. Basta, então, memorizar a senha
mestra.
A ideia não é unânime entre os analistas, até porque, caso você esqueça a senha mestra, terá uma grande dor de cabeça.
Mas atenção: Bonneau lembra que de nada adiantam essas precauções se o
seu computador estiver infectado com programas malignos como
“keyloggers”, que “leem” tudo o que for digitado ou clicado. Aí, por
melhor que seja a sua senha, ela será lida pelo hacker.
Para se prevenir, evite digitar senhas importantes em computadores de
lan-houses e, no computador pessoal, tome cuidado ao instalar programas e
mantenha antivírus e atualizações em dia.

opção esqueci minha senha (Foto: Reprodução)
Sites confusos
Um empecilho extra é que, mesmo que usuários queiram criar senhas
simples, muitas vezes são forçados pelos sites de cadastro a montar
combinações difíceis de letras maiúsculas e minúsculas, números e
caracteres especiais.
A professora Cristina Asperti, 58 anos, de São Paulo, já desistiu de
fazer compras em muitos sites por não se lembrar das senhas. “Os sites
estão mais confusos do que eles imaginam e mais difíceis do que
deveriam”, opina.
Em casos assim, será muito perigoso anotar as senhas, para não ter que memorizá-las?
“O que você tem que se perguntar é: de quem quer se proteger?”, afirma o
brasileiro Dinei Florencio, pesquisador na Microsoft Research. “Se o
risco maior for o de encontrarem a anotação em sua casa, então não
anote. Mas se o agressor em potencial for remoto, não há problema em
anotar.”
Ele diz que muitos previram a extinção do sistema de senhas online, mas
este sobrevive porque traz vantagens: “é conveniente, amigável ao
usuário e as pessoas já conhecem seu mecanismo”.
Joseph Bonneau acredita que, na próxima década, talvez precisemos
memorizar menos senhas, já que alguns sites começam a fazer logins
integrados (ou seja, com um mesmo cadastro você acessa mais de um site).
Quanto a sistemas alternativos de verificação – biométricos, por
exemplo -, Florencio acha que eles demorarão a ser aplicados em grande
escala. Um dos motivos é que demandariam que usuários instalassem
softwares, câmeras, leitores…
“Até que outros sistemas sejam igualmente amigáveis, será difícil
substituir as senhas”, opina ele. “E acho que seus inconvenientes ainda
são pequenos em comparação aos benefícios e ao controle que elas
proporcionam aos usuários.”